As principais barreiras de acesso em sites do e-commerce brasileiro


Foto de uma mão segurando um cartão de crédito em frente a um laptop. Na tela, há fotos de relógio e outros produtos que estão desfocados.

Motivação

O Movimento Web para Todos tem o objetivo de mobilizar a sociedade para a causa da acessibilidade digital e contribuir para transformar a web brasileira em um ambiente inclusivo para todos. Essa motivação conta com a realização de algumas atividades que vão além de conscientizar pessoas, empresas e desenvolvedores. O Movimento realiza testes para identificar as barreiras de acesso em sites e orientar empresas sobre como solucionar essas barreiras.

A web tem dado cada vez mais autonomia para pessoas com deficiência. Pessoas que não conseguem se deslocar com autonomia para uma loja física podem realizar suas compras online no conforto de suas casas. Consumidores que dependem de ajuda de terceiros para descrever um produto e efetuar um pagamento em lojas físicas podem fazer uma compra com mais segurança em uma loja virtual que tenha recursos para as pessoas com deficiência visual.

Com base em uma premissa de uma web acessível para todas as pessoas, o Movimento Web para Todos promoveu um estudo para identificar as barreiras de acesso nos principais sites de comércio eletrônico do Brasil. O resultado mostra que nem todas as pessoas conseguiram executar todas as tarefas para concluir uma compra em websites de comércio eletrônico.

Introdução

Pessoas com deficiência costumam navegar utilizando recursos específicos para acessar conteúdo na web. Alguns desses recursos são chamados de Tecnologia Assistiva – que permite , por exemplo, que uma pessoa cega consiga ler o conteúdo de uma página com um software que converte o código em informações em áudio. Na maioria das vezes, sua navegação não é feita com um mouse, pois depende de orientação visual. Por esse motivo, elas utilizam o teclado para navegar por uma página Web.

A navegação por teclado tem um papel importante para a acessibilidade. É dessa forma que pessoas com deficiências motoras costumam navegar. Elas utilizam ponteiras na boca ou na testa para navegar pelas teclas e acessar os itens interativos da página.

Esse tipo de navegação também tem impacto no acesso por dispositivos móveis. Mesmo considerando que não existem teclados físicos nos smartphones, o acesso especialmente para pessoas cegas se dá por toque (swipe) da esquerda para a direita para navegar de forma linear pelo conteúdo interativo.

É importante dizer que as dificuldades não são encontradas somente por pessoas que navegam por teclado: pessoas que têm dificuldade em clicar em ícones pequenos, seja por uma doença ou por destreza motora reduzida pela idade, podem não conseguir efetuar uma compra em um e-commerce.

Os resultados abaixo apresentam os dados reunidos a partir das 56 avaliações dos sites nas mais diversas situações. Esses números mostram que algumas barreiras de acesso podem ser cruciais para a efetivação de uma compra online.

O estudo consistiu em convidar especialistas em acessibilidade para navegar e executar tarefas utilizando os mesmos recursos que pessoas com deficiência usam ou navegando com plug-ins que simulam algum tipo de deficiência.

O estudo verificou o processo de navegação e compra nos sites de e-commerce mais acessados do Brasil segundo o Alexa em janeiro de 2018. Ao todo, foram criados três perfis, para que os avaliadores pudessem testar as páginas. Seguem, abaixo, cada um deles:

  • Leitor de tela – 25 avaliações
    Nesse perfil, o usuário deverá navegar pelo site utilizando um leitor de tela – de preferência com o monitor desligado ou com a iluminação no mínimo.
  • Navegação por teclado – 18 avaliações
    Esse perfil irá navegar por todo o site utilizando somente o teclado. Ele não poderá, em hipótese alguma, utilizar o mouse. Recomendamos que o mouse seja desligado.
  • Dificuldade motora de interação – 13 avaliações
    O usuário irá utilizar uma extensão para o Google Chrome – chamada “Funkfiy – Disability Simulator” – que irá simular uma dificuldade motora. A opção selecionada deve ser a “Elderly Ellen”, com o blur definido em “1”.

A metodologia foi criada com o objetivo de executar tarefas relacionadas à navegação e à compra de produtos no sites. As tarefas foram feitas com base nos princípios de acessibilidade do W3C, as WCAG. Cada avaliador navegou por um número determinado de sites. Abaixo, apresentamos o resultado obtido com os testes.

IMPORTANTE:
Os resultados correspondem aos testes em todos os sites e não a um site específico. O objetivo desse teste é apontar as barreiras de acesso mais comuns que podem afetar qualquer site e não apontar o melhor ou pior site em relação à acessibilidade.

Análise dos resultados

Com base na percepção dos especialistas em acessibilidade simulando navegações de pessoas com deficiência, pudemos medir números de suas percepções com relação a sua navegação nos sites. Esses números são representados pelos dados apresentados da seguinte forma:

  • Acesso ao site
  • Busca de um produto
  • Carrinho de compras
  • Criação da conta
  • Finalização da compra

Acesso ao site

O bloco de testes que avalia o acesso ao site buscou identificar as principais barreiras ao navegar pelo site. Considerando o acesso de pessoas com deficiência, verificamos como e se as pessoas conseguiam acessar as principais áreas do site.


Imagens acessíveis

O acesso às imagens por pessoas com deficiência visual (cegas ou de baixa visão) se dá pelo uso de leitores de tela que identificam os textos alternativos e retornam o conteúdo em forma de áudio para o usuário. Quando esses textos não existem ou estão incompreensíveis, o usuário pode não entender o contexto ou o significado daquela imagem.

O estudo avaliou se os textos alternativos das imagens existiam e se era possível compreendê-los. Usuários de leitores de tela identificaram que apenas em 25%* dos casos foi possível identificar e compreender a imagem utilizando um leitor de tela sem a referência visual.

* 24 respostas. Dados se referem às respostas por testes com leitores de tela.

Navegação por teclado

Um dos recursos importantes para a navegação é permitir que o usuário consiga identificar onde está o foco dessa ação. Ao saber o foco, ele consegue identificar os itens interativos da página e navegar normalmente. Quando esse foco não está visível, o usuário se perde na navegação e pode clicar em links por engano. O ideal é que o foco esteja visível não somente quando se passa o mouse, mas quando se faz o foco por teclado. Na análise dos sites, pudemos perceber que somente 39%* dos usuários conseguiram perceber que o site exibe o foco quando a navegação por teclado acontece.

Para usuários de leitores de tela, a estrutura de cabeçalhos é importante para que possam navegar e identificar áreas importantes no site. Por exemplo, ao pressionar a tecla “H” o usuário navega por todos os cabeçalhos da página, ao pressionar a tecla “1”, ele navega pelos cabeçalhos de nível 1 e assim por diante. Somente 17%** dos sites avaliados tinham uma estrutura de cabeçalhos adequada para possibilitar a navegação por leitores de tela.

* 28 respostas. Os dados se referem às respostas dos testes por navegação via teclado e para deficiência motora. Respostas dos leitores de tela (usuários cegos ou de baixa visão severa) não entram nesse número.
** 24 respostas. Dados se referem às respostas por testes com leitores de tela.

Suporte a LIBRAS

LIBRAS é o acrônimo para a Língua Brasileira de Sinais, idioma oficial do Brasil. É uma das formas que pessoas surdas se comunicam, utilizando sinais para transmitir informações para seus interlocutores. Conteúdos em LIBRAS em vídeos ou aplicativos ajudam as pessoas a traduzir conteúdo em texto para sinais. Nos testes executados, apenas uma das pessoas que testou os sites encontrou uma forma de traduzir o conteúdo para LIBRAS. Isso representa apenas 2%* dos testes realizados e representa que em apenas 7%** dos sites foi encontrado uma forma de consumir conteúdo em LIBRAS.

* 52 respostas.
**15 sites pesquisados.

Acesso a contatos e dados da empresa

Quando o usuário precisa entrar em contato com a loja, ele costuma procurar meios para contato, como telefone ou link para chat. No nosso estudo, 70%* dos avaliadores encontraram a forma de entrar em contato com o estabelecimento com facilidade.  

Os testes também verificaram se as pessoas conseguem encontrar, de forma fácil, os dados da empresa, como CNPJ e endereço da empresa. Em 43%** dos testes, não foi possível encontrar de forma fácil  os dados da empresa que constam no rodapé de todas as páginas.

*55 respostas.
**53 respostas.

Aumento de fontes

Pessoas com baixa visão costumam aumentar o tamanho das fontes para conseguir ler e interagir melhor com a página. A partir disso, o estudo verificou como os sites se comportam quando são configurados para ter um zoom de 200%. Isso acontece para simular como é a navegação de uma pessoa com dificuldade em enxergar e navegar em uma página com letras muito pequenas. Neste item, 54%* dos avaliadores disseram que a página se comportou adequadamente quando foi exibida com zoom de 200%.

* 28 respostas. Os dados se referem às respostas dos testes por navegação via teclado e para deficiência motora. Respostas dos leitores de tela (usuários cegos ou de baixa visão severa) não entram nesse número.

Busca de um produto

As pessoas que testaram os sites receberam a tarefa de fazer a busca de determinados produtos em cada site, com  navegação por teclado utilizando leitores de tela ou plug-ins que simulam deficiências motoras.

Localizando produtos no site

Foi verificado se os avaliadores conseguem pesquisar um produto navegando pelo menu do site nas mais diversas situações: com leitores de tela, com simulação de dificuldade motora e navegando por teclado.  Em 55%* dos casos, não foi possível navegar plenamente pelo menu do site.

Também foi solicitado aos usuários para localizarem o campo de busca para procurar um produto. A localização do campo de busca foi mais fácil para as pessoas que puderam utilizar a referência visual para acessá-lo. Usuários de leitores de tela tiveram dificuldades em identificar os campos.  Ao todo, 60%** das pessoas que navegaram com leitores de tela disseram que conseguiram localizar o campo de busca com facilidade. Nos outros perfis de navegação (deficiência motora e navegação por teclado), os números foram de 85%*** e 78%**** de sucesso, respectivamente.

Para fazer uso dos filtros e refinar a busca pelos produtos, os usuários com leitores de tela tiveram mais problemas para executar essa tarefa. Apenas 48%***** dos avaliadores conseguiram utilizar os filtros para refinar sua busca.

*55 respostas.
**25 respostas. Dados se referem às respostas por testes com leitores de tela.
***13 respostas. Dados referentes às respostas por simulação de deficiência motora.
****18 respostas. Dados referentes às respostas por navegação por teclado.
*****25 respostas. Dados se referem às respostas por testes com leitores de tela.

Carrinho de compras

O processo de compra passou pela avaliação da possibilidade de adicionar e retirar produtos no carrinho de compra.

Informações sobre os pagamentos e descontos

Um dos itens importantes para uma compra é que a informação sobre pagamentos e que opções de compra e desconto estejam claras no site. Em 79%* dos testes, os usuários encontraram  as informações sobre pagamentos de forma clara. Em relação às informações sobre compra e desconto, 73%** dos respondentes disseram que as opções de compra e descontos estavam claras nos sites.

*55 respostas.
**55 respostas.

Colocando e modificando itens do carrinho 

Mesmo considerando que a maioria das pessoas conseguiu executar a tarefa de colocar os itens no carrinho, a alteração dos itens não foi tão simples para usuários de leitores de tela. Ao todo, 32%* das pessoas que utilizaram um leitor de tela e tentaram alterar a quantidade de produtos no carrinho não conseguiram executar essa tarefa.

*25 respostas. Dados se referem às respostas por testes com leitores de tela.

Criação da conta

O processo de compra de um produto passa pela etapa de criação de uma conta no site para adicionar endereços de entrega e dados para pagamento em alguns casos. Os formulários precisam ser simples e intuitivos para que as pessoas não tenham problemas ao preenchê-lo, especialmente pessoas com deficiência.


Preenchimento do formulário de cadastro

Antes de finalizar a compra, os usuários testaram a facilidade de preencher os formulários de cadastro no site. 28%* deles disseram que não conseguiram preencher todos os campos do formulário por algum motivo.

*53 respostas.

Corrigindo erros 

Nem todas as pessoas conseguiram concluir seus respectivos cadastros devido aos problemas ou dificuldades encontradas no formulário. Muitas vezes não é possível concluir a compra porque os campos obrigatórios não estão marcados corretamente ou não apresentam informações claras. Nos testes com os usuários, 37%* declararam que as informações para corrigir erros no formulário não estavam claras e que isso dificultou (e em certos casos até impediu) o processo de conclusão do cadastro.

*48 respostas.

Finalização da compra

Finalmente, avaliamos o processo final da compra. Esse processo pressupõe que o usuário conseguiu colocar o produto no carrinho, criou um cadastro e selecionou sua forma de pagamento adequada.


Concluindo o processo de compra

Em aproximadamente 28%* dos testes, as pessoas afirmaram que o processo da compra não funcionou corretamente. Parte das pessoas não conseguiu efetuar a compra na própria interface de pagamento de algumas lojas, mas algumas nem conseguiram chegar a essa etapa. O número de pessoas que não conseguiu efetuar a compra por alguma razão prévia (não concluiu o cadastro, não conseguiu colocar itens no carrinho, etc) representa 57%** das pessoas que não conseguiram efetuar essa etapa.

*46 respostas.
**23 respostas. Resposta de pessoas que não conseguiram finalizar o processo de compra.

Cancelando uma compra

O processo de cancelar uma compra feita nos sites não foi um processo simples para a maioria das pessoas. Daqueles que conseguiram concluir o processo de compra, 67%* das pessoas não conseguiram cancelar sua compra no site, seja por inacessibilidade ou por falta de informações claras sobre o processo de cancelamento.

*39 respostas.

Conclusão

O processo de compra em um site de comércio eletrônico não é simples. O usuário tem diversos passos a percorrer até concluir uma compra. E essas etapas podem ser ainda mais difíceis para  usuários com deficiência. O que pudemos perceber nessa avaliação é que a falha em um processo pode acarretar a impossibilidade de concluir uma compra. Se a busca no site, o carrinho de compras, o cadastro ou o pagamento tiverem uma barreira de acesso, o usuário pode não conseguir efetuar sua compra.

Na maioria dos casos, a correção do erro é simples e a identificação desse erro também.

Um sistema de e-commerce acessível pode fidelizar o usuário e trazer não só o cliente de volta ao site, mas também serve como propaganda para amigos, o que  pode trazer mais consumidores para a loja. Por outro lado, a falta de acessibilidade em um site de e-commerce pode acarretar desde a perda de um cliente até comentários negativos em redes sociais e processos legais.

Acessibilidade é um direito do cidadão e uma vantagem comercial para as empresas.


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