Qualquer organização, de qualquer tamanho, complexa ou não, pode e consegue ter seus canais digitais acessíveis. Quando esses canais são planejados com acessibilidade desde o início, os resultados são melhores e mais otimizados, incluindo redução de custos e de tempo, mudança de cultura da empresa e engajamento por parte dos colaboradores.
Para conhecer um pouco mais essa realidade na prática, conversamos com Odilon Gonçalves. Designer por formação, Odilon lidera a Espiral Interativa, agência especializada em acessibilidade digital que fundou o Movimento Web para Todos, em parceria com o W3C Brasil e outras 20 organizações parceiras. Desde que integrou o time da Espiral, 12 anos atrás, Odilon se especializou em design inclusivo, priorizando nos projetos web que desenvolve a experiência do usuário com algum tipo de deficiência.
Confira o bate-papo que tivemos com ele e compartilhe com a sua equipe!
Movimento Web para Todos – De que forma a Espiral costuma abordar a importância da descrição das imagens nas redes sociais e nas plataformas/sites? Qual é a melhor forma de conscientizar os clientes em relação a esse tema?
Odilon – Descrição de imagem é um excelente exemplo para demonstrar o que é acessibilidade digital para alguém que não tenha muito conhecimento técnico sobre web. Ao vender um projeto, gostamos de demonstrar, na prática, os benefícios que a acessibilidade traz para todos e esse exemplo é um dos que mais usamos nessa simbologia. Gostamos de usá-lo para mostrar que não é difícil pensar de forma acessível, que não é um bicho de sete cabeças.
Os clientes, em geral, querem implementações rápidas e baratas. Costumam nos procurar buscando plugins que, “num passe de mágica”, transformem os sites e costumam assustar se falamos de mudanças nos códigos de um site.
Movimento Web para Todos – Como tem sido o feedback deles para a implementação dessa prática no dia a dia?
Odilon – As descrições de imagens têm sido bem aceitas e implementadas por praticamente todos os nossos clientes. Obviamente, acompanhamos e sempre alertamos para que essa prática se mantenha na rotina da equipe. Falando sobre recursos de acessibilidade como um todo, o fato é que a porcentagem de absorção do que recomendamos ainda é menor do que gostaríamos. Ao deixar para pensar em acessibilidade depois que um site já está de pronto, o cliente precisa assumir possibilidades de refação e isso, normalmente, causa indisposição no time que está colocando a mão na massa. É comum programadores e designers falarem: “Mas eu pensei num caminho diferente. Vou ter que jogar fora o que já fiz?”. Se estiver usando os padrões de Web Semântica, não precisará jogar nada fora. Apenas fazer algumas adaptações.
Movimento Web para Todos – Quais são os desafios para que isso aconteça?
Odilon – É fundamental que todas as partes envolvidas no projeto tenham “comprado” a importância da acessibilidade, especialmente quem aprova as entregas. A liderança não pode impor decisões que compliquem a acessibilidade. Um exemplo clássico são e-commerces que, para atrair a atenção dos usuários, estampam banners e chamadas para vendas a todo o momento, sem que o usuário escolha acessar essas informações.
Voltando para as descrições de imagens, considerando que elas são fundamentais para que os cegos e pessoas de baixa visão possam navegar, já que são reproduzidas pelo leitor de tela, eu diria que é um recurso que deveria ser obrigatório e constar no topo da lista de qualquer checklist de testes (QA).
Movimento Web para Todos – Tem alguma dica infalível como argumento para que os clientes entendam não só a importância da descrição, mas também que inclua a acessibilidade como um princípio da empresa? A empresa tem esse papel também de educá-lo?
Odilon – Pela minha experiência, percebo que os times de desenvolvimento seriam muito mais receptivos a implementar a acessibilidade se ela aparecesse como requisito no briefing inicial do projeto. Quer ver um time se desesperar? Peça para jogar trabalho fora ou sinalizar a inclusão de algo que estava fora do escopo. Sugiro que as empresas incluam a acessibilidade em seus modelos de briefing, para que todo projeto, desde a fase de orçamento, contemple acessibilidade.
É fundamental que as organizações, caso não tenham expertise com acessibilidade e contratem um parceiro, exijam desse fornecedor a comprovação de vários projetos realizados com acessibilidade. Mais do que saber a teoria da coisa, é importante ter noção da experiência da pessoa com deficiência com tecnologias assistivas e quais são os melhores caminhos para melhorar a experiência de navegação. Para mim, isso é mais importante do que receber uma certificação ou que o site tire uma nota boa em um validador automático. Outra dica fundamental é envolver pessoas com deficiência nas etapas de testes, especialmente os cegos.
Movimento Web para Todos – Quais elementos em um site precisam de descrição? Quais cuidados o gestor e a equipe devem ter?
Odilon – Eu criei uma forma de análise que ajuda muito no dia a dia para a tomada rápida de decisões. Ela não consta em nenhuma documentação ou cartilha, mas é bastante didática: identifique, entre os elementos gráficos e imagens do seu site, quais têm função informativa e quais têm papel ilustrativo. Os elementos informativos precisam de descrição! Exemplo: temos um site notícias e, dentro de uma das matérias, existe uma tabela que, por agilidade, foi feita por um designer e gravada como imagem. O ideal é que essa tabela fosse tratada como código. Porém, caso não seja possível, pode receber descrição de imagem. Outro exemplo bem bacana: botões e elementos clicáveis, como setas e sinais de “+” (adição). O ideal é que tenha um elemento textual com esses ícones. Se não tiver, descrevam o componente indicando qual ação acontecerá a partir da interação.
Movimento Web para Todos – O que falta, na sua opinião, para a acessibilidade se tornar realidade nas empresas?
Odilon – Como comentei, não é um bicho de sete cabeças. A informação sobre acessibilidade digital está disponível – seja aqui na plataforma do Movimento, seja nas próprias diretrizes WCAG 2.1. O que falta realmente é fazer com que esse conhecimento técnico chegue na alta liderança das corporações e nos profissionais que trabalham com marketing digital. Eles precisam entender que é uma super oportunidade de ampliar o negócio, que existe uma lei (a Lei Brasileira de Inclusão) que pode ser aplicada contra as empresas caso não tenham acessibilidade nas suas páginas e aplicativos, e que é uma maneira de diferenciar institucionalmente a sua marca. Daí, sem dúvida, essa transformação vai acontecer muito mais rápido. Eu e a Espiral estamos fazendo a nossa parte há mais de uma década, entregando projetos digitais inclusivos para todos! E a sua organização? Já está adequada para essa realidade?
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