Seletores de data, acessibilidade e usabilidade


Foto de um idoso na frente de um computador. Na tela aparece um seletor de número de código de país e um calendário para selecionar a data.

Por Reinaldo Ferraz*

Nesses dias fui buscar informações sobre um tipo de visto em um site de consulado fora do Brasil. Além dos diversos problemas de acessibilidade encontrados (CAPTCHAs e falta de navegação por teclado), o que mais me aborreceu foram os seletores de data e números. Nenhum deles permite a digitação de números.

Primeiro eu tinha que colocar meus dados. Eu nasci na década de 70, então rolar um seletor da data de hoje até o ano do meu nascimento é uma tarefa incômoda. Depois eu tinha que selecionar a data de emissão e validade do passaporte (duas vezes) somente pelo seletor de datas.

A cereja do bolo desse site fica na parte de contato. Para selecionar um país você tem que escolher o código de país organizado por ordem alfabética e com ícones das bandeiras. Somente pelo seletor. Digitar apenas “+55” resolveria, mas tive que rolar da letra “M” até o “B” para selecionar o Brasil.

Tudo isso seria mais fácil se eu pudesse digitar as datas e números exigidos.

O problema é que isso não é algo exclusivo desse consulado. Milhares de sites utilizam seletores de data customizados de bibliotecas e muitas vezes eles são implementados sem o cuidado de habilitar a digitação pelo usuário.

Alguns podem argumentar que a exigência de um padrão específico de data serve para evitar erros. Porém, hoje existem diversas formas de guiar o usuário para que ele não preencha a data em formato errado. Dá para fazer um verificador de formato com poucas linhas de código.

Parece exagero e até bobagem esse tipo de reclamação, mas em um mundo que tentamos tornar tudo mais fácil para o usuário, um site que exige algo tão específico pode perder visitantes pela dificuldade de preenchimento de campos.

Por que isso prejudica a usabilidade e a acessibilidade?

  • Cansaço e perda de foco
    Rolar dezenas de itens é lento, especialmente em dispositivos móveis ou com trackpad.
  • Problemas com leitores de tela
    Navegar item por item vira uma experiência ruim, onde o usuário precisa navegar por muitos números.
  • Pessoas com mobilidade reduzida sofrem
    Gestos repetitivos se tornam dolorosos e quase impossíveis para algumas pessoas.
  • Sentimento de que “isso podia ser mais fácil”
    Mesmo usuários sem deficiência percebem: “por que não posso digitar logo?”

Boas práticas para seletores numéricos

  • Permita digitação direta
    Mesmo se for um dropdown, ofereça entrada com type=”number” ou campo de texto com validação de formato.
  • Feedback em tempo real
    Forneça informações se o número digitado está fora dos limites (ex.: “de 1 a 200”).
  • Garanta compatibilidade com leitores de tela
    Utilize atributos de ARIA, especialmente para componentes dinâmicos
  • Mostre limites e contexto
    Atributos como minmax e step dão informações úteis para digitação.

O resultado de aplicar essas boas práticas é uma experiência de uso muito mais fluida e inclusiva. Menos cliques significam menos desgaste físico e cognitivo, especialmente para pessoas com deficiência ou usando tecnologia assistiva. A possibilidade de digitação direta garante agilidade e reduz a chance de erros ou frustração, o que diminui as taxas de desistência. No fim das contas, entregar uma interface acessível e eficiente é respeitar a diversidade de usuários e também garantir conformidade com padrões técnicos e legais, reforçando a credibilidade e o profissionalismo do projeto.

Este texto foi publicado no dia 14/7/25 no blog de Reinaldo Ferraz, especialista em acessibilidade digital no NIC.br e um dos embaixadores do Movimento Web para Todos.


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