Legendas: o que você precisa saber para torná-las acessíveis


Ilustração de um vídeo projetado na tela de um computador. Há desenho de uma pessoa e uma faixa branca na parte inferior da tela com uns riscos. Dela sai uma caixa de diálogo em vermelho com as letras CC, iniciais de closed caption.

Qual a cor adequada de fundo? Que tipo e tamanho de fonte devo utilizar? Posso destacar algumas palavras em cores diferentes? São muitas as dúvidas relacionadas à aplicação adequada das melhores práticas de acessibilidade para a exibição de legendas. 

Pensando em contribuir com essas e outras respostas sobre o tema, compilamos uma série de informações (jurídicas, técnicas e de usabilidade) e dicas bem bacanas que certamente ajudarão você na hora de produzir peças audiovisuais mais acessíveis para todo mundo. 

A nossa reportagem foi feita principalmente com base na Norma da ABNT 15.290, que estabelece Acessibilidade em comunicação na televisão, e no “Guia para produções audiovisuais acessíveis”, produzido pelo Ministério da Cultura com apoio de uma equipe de docentes, pesquisadores e pesquisadoras na área de acessibilidade. O guia levou em consideração uma extensa pesquisa bibliográfica, trazendo referências e boas práticas recomendadas tanto no Brasil quanto no exterior.

A legenda que abordaremos aqui é o letreiro sobreposto à imagem de filmes que descreve a informação que está sendo transmitida em áudio e que ficam geralmente na parte inferior da tela. 

É importante pontuar que há diferença entre legendas feitas para pessoas surdas e ensurdecidas (LSE) e legendas direcionadas a ouvintes. De maneira resumida, as legendas para quem ouve traduzem ou descrevem apenas as falas. Já as direcionadas para pessoas que não ouvem incluem informações e marcações de todos efeitos sonoros importantes na cena, como música, latidos, gritos, choros, risos, sons de motores, de trovão etc. 

O que diz a Lei e os critérios WCAG

O artigo 67 da Lei Brasileira de Inclusão (LBI) obriga que os serviços de radiodifusão de sons e imagens devem permitir o uso dos seguintes recursos, entre outros:

  • Subtitulação por meio de legenda oculta;
  • Janela com intérprete da Libras;
  • Audiodescrição. 

E quando falamos em sites e outros canais digitais, a obrigatoriedade das legendas também acaba aparecendo no artigo 63, já que determina que todos os sites de empresas com representação no Brasil estejam acessíveis às pessoas com deficiência.

Nas WCAG há dois critérios específicos para legendas (1.2.2 para as pré-gravadas como nível A; e a 1.2.4 para as legendas ao vivo como nível AA). Ou seja, é tratada como diretriz básica de acessibilidade digital.

Há também a ISO/IEC TS 20071-25:2017, norma europeia que fornece recomendações sobre a apresentação de áudio de legendas e outros textos na tela para uso em todos os tipos de vídeos.

Os diferentes tipos de legendas

CC (closed caption): legenda oculta em texto que aparece opcionalmente na tela onde está sendo exibido o vídeo, a partir do acionamento do dispositivo decodificador, interno ou periférico.  Ela pode ser produzida em tempo real, ou seja, no mesmo instante em que o programa está sendo exibido, ou pode ser inserida manualmente ou automaticamente depois que o vídeo estiver pronto ou gravado.

Legenda aberta ou “queimada”: inserida no arquivo final do vídeo e fica sempre visível. É bastante utilizada em vídeos para as redes sociais, especialmente o Instagram, já que ainda não permite anexar um arquivo de legenda .SRT. 

Do ponto de vista da acessibilidade, é sempre melhor optar pelas legendas ocultas pois podem ser lidas pelo leitor de telas, beneficiando também pessoas com baixa visão severa ou cegueira, e pelo teclado Braille, utilizado também pelas pessoas surdocegas. Outro benefício dessa versão é permitir a escolha de idiomas (especialmente no Youtube), além de possibilitar ser editada para fazer ajustes nos textos.

As legendas também podem fazer uma enorme diferença quando se trata da estratégia de SEO (Search Engine Optimization, ou Otimização para Mecanismos de Busca). “Isso porque o Google e outros buscadores não podem “assistir a um vídeo”, mas conseguem obter informações através do texto incluído nas legendas”, explica Wagner Medici, diretor de vendas da Steno. 

Em entrevista concedida ao nosso embaixador Alexandre Ohkawa, o executivo complementa que o texto usado na legenda, por ser indexado, aumenta a profundidade da busca por palavras-chave. “Fora do closed captioning, a única informação que o Google tem para indexar o vídeo é o título e a descrição, o que pode não ser suficiente para garantir uma boa classificação na busca orgânica”, acrescenta.

Técnicas recomendadas para construção de legendas

  • Tempo que as legendas ficam na tela: entre 1 e 6 segundos, ou seja, o texto não pode ficar ali por menos de 1 segundo, nem mais de 6. 
  • Número de linhas que uma legenda pode ter: até duas linhas é o mais confortável e mais fácil de compreender o conteúdo do texto e da imagem.
  • Frases longas, na maioria das vezes, podem ser divididas em várias legendas. As curtas podem ser agrupadas para evitar o estilo telegráfico que prejudica a compreensão.
  • Tipologia e fontes:
    • Largura = 2/3 da altura 
    • Espessura do traço = 1/7 da altura (caractere claro sobre fundo escuro) 
    • Distância entre letras = 1/5 da altura 
    • Distância entre palavras = 2/3 da altura 
    • Intervalo entre linhas = 1/5 da altura 
    • Altura da letra minúscula = 2/3 da altura da letra maiúscula
  • Número de caracteres por linha: no máximo 32.
  • É recomendado escrever com maiúsculas e minúsculas e seguir sempre as regras gramaticais, pois assim a compreensão do conteúdo fica mais fácil.
  • A norma ABNT recomenda que os caracteres estejam na cor branca, pois assim permite maior eficácia na leitura. Para um maior conforto, recomendamos também que as legendas estejam sobre fundo preto. Há também a opção de colocar os caracteres em amarelo sobre fundo preto, aumentando ainda mais o contraste e melhorando a experiência de pessoas surdocegas.
  • Uma boa marcação de legenda é aquela que consegue obter o exato sincronismo entre as falas do filme e as legendas.
  • Usar itálico apenas para legendar vozes vindas do interfone, do rádio, da TV, do computador ou de um alto-falante qualquer. O itálico também pode ser usado para traduzir letras de canções ou vozes “em off”, ou seja, aquelas de pessoas que não podem ser vistas em cena.
  • Escrever efeitos sonoros sempre entre colchetes.
  • O símbolo da nota musical deve ser usado para diferenciar a música da palavra falada:
    • A informação sobre a música (se é fundo musical, rock, música romântica ou de suspense, se é cantada etc.) deve vir entre notas musicais.
    • No caso de transcrição da letra da música, devem ser incluídas duas notas musicais seguidas ao final da transcrição para indicar seu término.
    • A letra da música deve ser transcrita sempre que possível. 
  • Posição na tela: a recomendação é que seja posicionada na parte de baixo da tela e centralizada. Essa posição é a preferida, segundo estudos citados no “Guia para produções audiovisuais acessíveis”, porque ocupa menos espaço e facilita a quem assiste ao vídeo a movimentação dos olhos da legenda para a imagem. Podem ser colocadas na parte de cima da tela quando os créditos do filme aparecem ou quando o fundo está muito claro, dificultando a visualização, por exemplo.
    • Segundo a ABNT NBR 15.290, no sistema “closed caption ao vivo” a legenda deve estar preferencialmente posicionada na parte inferior da tela. A legenda deve ser posicionada na parte superior quando houver necessidade de inserção de outros textos na parte inferior.
    • No sistema “closed caption gravada” é permitido posicionar as legendas em diferentes níveis da tela (inferior, médio ou superior), de acordo com situações cênicas específicas, exposição de créditos ou letterings. Pode ser colocada, inclusive, próxima a quem estiver falando como forma de identificação. Nossa recomendação é que se altere o mínimo possível a posição das legendas ao longo de um vídeo, pois isso pode ser algo bastante desconfortável especialmente para pessoas neurodiversas, que se apoiam muito em padrões.

O que indica cada pontuação na legendagem

Segundo o LATAV – Laboratório de Tradução Audiovisual da Universidade Estadual do Ceará as pontuações nas legendas passam as seguintes informações:

  • Vírgula: indica pausa ou aposto se a vírgula vier dentro da mesma legenda. Entre legendas ela é desnecessária porque a transição de uma para outra já indica pausa.
  • Ponto final: indica que não há continuação na legenda.
  • Dois pontos: introduz ou anuncia algo.
  • Aspas: reproduz as palavras exatas de alguém.
  • Exclamação: deve ser usada somente se for extremamente necessário para que a pontuação não perca a força. Geralmente, as imagens já transmitem a emoção da cena.
  • Interrogação: indica uma pergunta.
  • Travessão: sinaliza na legenda que duas pessoas estão falando na mesma cena. Ao contrário do texto escrito convencional, a próxima palavra encosta na pontuação, já que o espaço conta como um caractere.
  • Três pontos ou reticências: indica hesitação.

E quando houver janela de Libras?

Segundo nosso embaixador Alexandre Ohkawa, há pessoas surdas sinalizantes e oralizadas que gostam que os vídeos tenham legendas e janela de Libras, pois isso aumenta a possibilidade de compreensão do conteúdo. “Mas o ideal seria oferecer a possibilidade de acionar a legenda e a janela Libras no momento que a pessoa desejar”, sugere.

Ele lembra que pessoas surdas não usuárias de língua de sinais, ouvintes que estão ensurdecidas e/ou com baixa audição escolhem legendas, pois se o ambiente estiver ruidoso, a boca da pessoa não estiver nítida ou a velocidade da fala for muito alta, nem toda informação pode ser captada pelos ouvidos ou pela leitura labial.

“Quando a velocidade da fala e, por consequência da legenda, é alta, a experiência de qualquer perfil de pessoa surda fica bastante prejudicada, pois há muita informação para ser processada e harmonizada ao mesmo tempo”, explica o Ohkawa.

Por isso, uma dica muito importante para tornar o conteúdo mais acessível para essa grande parcela da população é procurar falar mais pausadamente para que as legendas possam ficar visíveis o tempo suficiente para a leitura e compreensão. Quando se fala muito rápido, pode ser necessário editar o conteúdo de sua fala para que as legendas caibam na cena e se encaixem dentro do tempo padrão.

É importante também pronunciar bem as palavras e evitar ruídos paralelos – essas pequenas ações ajudam a melhorar a qualidade das legendas automáticas, restando poucas edições a serem feitas no material final a ser divulgado para o público.

Dicas de ferramentas para criar e editar legendas

Separamos algumas ferramentas bem bacanas para quem deseja gerar e editar legendas. Vale conferir todas elas e descobrir qual melhor se adequa às suas necessidades de edição. Lembramos que em algumas redes sociais como Instagram e Facebook, já é possível configurar a exibição de legendas automáticas nas postagens de vídeo. 

Principais referências pesquisadas para produção dessa matéria:


* Este conteúdo foi produzido com o apoio de Alexandre Ohkawa, arquiteto, consultor, gestor e especialista em acessibilidade, diversidade (comunidade surda), cultura e inclusão. É também presidente da Associação de Surdos do Estado de São Paulo Vem Sonhar e um dos embaixadores do Movimento Web para Todos.


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