Carrosséis em sites são inimigos da acessibilidade?


Foto de um computador de mesa num fundo branco. Na tela, há a imagem da página inicial de um site ilustrativo com destaque para a área do banner. Nele, há foto de uma espreguiçadeira sobre um deck de madeira e, ao fundo, a vista do mar.

A habilidade de mostrar mais conteúdo em menos espaço de um jeito dinâmico e moderno fez com que os carrosséis ganhassem escala em muitos sites no Brasil e no mundo. Hoje, há quem o defenda e quem o abomine.

Há alguns estudos que afirmam que a taxa de engajamento em carrosséis é muito baixa e que, só por isso, já há justificativa para abandoná-los. Há quem acredite que internautas associam mentalmente os carrosséis à página equivalente a lixo eletrônico. E, quando isso acontece, aquela área do site é simplesmente ignorada por quem está ali navegando.

Nesta matéria não pretendemos avaliar se você deve ou não eliminar o carrossel de seu site. Mas trazer informações importantes para você tomar a melhor decisão do ponto de vista da acessibilidade.

Muitos carrosséis são cheios de barreiras de acessibilidade, o que acaba impedindo ou dificultando a experiência de navegação de bastante gente. Estamos falando de pessoas com cegueira ou baixa visão que navegam com apoio de software de leitura de tela, pessoas neurodiversas, quem tem deficiência motora ou mobilidade reduzida nos braços e mãos, entre outras. 

O que torna um carrossel não acessível?

Quando um carrossel é desenvolvido sem seguir as diretrizes de acessibilidade, ele acaba sendo um problema para o site como um todo, sem contar que se desperdiça um excelente espaço para divulgação de produtos e promoções, por exemplo. A seguir, listamos algumas das principais barreiras de acessibilidade que encontramos neste tipo de recurso:

  • Muitos carrosséis se movimentam automaticamente sem a opção de desligar ou de controlar esse movimento. Isso pode causar, por exemplo, efeitos indesejados em pessoas neurodiversas, como distração, convulsões ou outro tipo de reação física.
  • Geralmente, não é fácil utilizá-los em dispositivos móveis quando se tem deficiência motora ou mobilidade reduzida nas mãos e braços. Ao selecionarmos um link com a intenção de girá-lo horizontalmente ou ao escolhermos um botão anterior ou posterior e voltar ao estágio inicial, por exemplo, pode ser um desafio muito grande para pessoas com este tipo de característica.
  • Carrosséis construídos rapidamente, a partir de plugins e de templates prontos, não vão interagir bem com leitores de telas, utilizados por pessoas com cegueira e baixa visão.

O que um especialista em design acessível tem a dizer sobre carrosséis?

Odilon Gonçalves, gerente de tecnologia e inovação do Museu da Pessoa e especialista em design acessível, conversou conosco sobre esse tema e trouxe insumos que ajudam tanto na avaliação da verdadeira função do carrossel em um site quanto do ponto de vista da acessibilidade.

Ele explica como é possível planejar e desenvolver esse recurso de maneira acessível, como adequar o que já estiver pronto, qual a evolução do carrossel numa sociedade que clama por mais inclusão, entre outros tópicos igualmente interessantes.

WPT: Como designer e especialista em acessibilidade digital, você é contra ou a favor dos carrosséis?

Odilon: Eu sou a favor da eliminação de carrosséis como os usados em muitas lojas virtuais, que são aqueles que têm muitos itens sequenciados, pouco tempo para ler cada destaque e aquelas “microbolinhas” que sinalizam qual deles está sendo exibido.

Sou a favor que os carrosséis sejam usados de forma pensada e “acessibilizada”. Ou seja, que sejam usados em casos em que não há outra alternativa, como em algumas experiências pontuais de navegação em exposições virtuais. 

Para o uso mais geral, não vejo problemas em carrosséis que tenham poucos itens destacados, que o controle de navegação esteja 100% na mão de quem navega e que essa pessoa não precise adivinhar qual é o conteúdo de cada um dos destaques (que haja um título que informe a ela tudo o que há de conteúdo no carrossel).

WPT: Há quem diga que os carrosséis estão associados a lixo eletrônico e que visitantes em uma página raramente vão clicar nele. Você também compartilha dessa mesma opinião? Por quê?

Odilon: Baseado na minha experiência de consultoria e avaliação de plataformas, há a ideia de que o carrossel temporizado – aquele que fica rodando com “vida própria” -, irá impactar o usuário ou a usuária em algum momento de sua navegação. A ideia não seria obrigar essa pessoa a ficar olhando fixamente para o carrossel até rolar todos os destaques. 

Eu não concordo com a ideia de que todos os conteúdos distribuídos em um carrossel sejam lixo eletrônico e já tive a oportunidade de encontrar bons materiais ou ofertas de produtos em carrosséis. 

Porém, na minha visão, o ponto é justamente este: se o conteúdo é bacana, por que ficar escondido entre tantos outros destaques? Se o conteúdo é “quente”, ou seja, baseado em algum fato importante que esteja acontecendo neste momento, minha sugestão é distribuí-lo ao longo da página para que se possa encontrá-lo sem a necessidade de ações de cliques. 

WPT: Qual seria a evolução dos carrosséis em um mundo que valoriza a inclusão de pessoas diversas no ambiente digital?

Odilon: Em tempos onde, no Brasil, a personalização do conteúdo, o machine learning, o uso de inteligência artificial estão em plena ascensão e o conceito de escalabilidade está mudando (cada pessoa quer ter uma experiência única), meu palpite é que o usuário ou a usuária se interessaria mais em navegar em um carrossel que tenha apenas conteúdos que são de seu interesse. 

Basta pensarmos no tempo que gastamos “zapeando” pelo Netflix até escolher o que assistir. A navegação dessas plataformas de streaming se baseia em carrosséis. Portanto, penso que os carrosséis, no formato atual, fazem internautas perderem tempo. 

Para mim, as perguntas a serem feitas para estimular a prototipação de novas soluções são: 

  • Qual algoritmo podemos usar para exibir o que cada cliente quer? 
  • Como podemos acelerar a exibição de conteúdos sem precisar acelerar a velocidade de transição de um carrossel ou do scroll (rolagem) da página? 
  • Como prender a atenção de possíveis clientes pensando em soluções apenas baseadas em UX (sigla em inglês para “user experience” ou experiência de usuário)? 
  • Como podemos criar um carrossel que não funcione, necessariamente, com exibição em série?  

WPT: É possível adaptar um carrossel já desenvolvido em um site e torná-lo acessível? Se sim, como isso poderia ser feito?

Odilon: Com certeza é possível. Do ponto de vista de UX, as dicas são:

  • Tirar a temporização e permitir que internautas naveguem ao seu ritmo, demorando o tempo que quiser entre cada destaque.
  • Ter poucos itens destacados.
  • Adicionar título ou alguma informação textual que permita à pessoa prever e escolher por quais conteúdos ela quer navegar.
  • Os botões para interação e controle da navegação precisam ser grandes.

WPT: É possível que um carrossel também seja acessível para quem navega em sites pelo celular?

Odilon: Sim. Se o carrossel for realmente necessário e fizer sentido dentro do conceito de navegação que se busca para a aplicação, entendo que as recomendações são parecidas com as que comentei até aqui. 

Do meu ponto de vista, a usabilidade de um carrossel é até mais bacana no celular, pois o efeito swipe (de deslizar o dedo na tela) é mais intuitivo. Nunca se deve desligar os recursos de navegação por swipe ou pelo movimento de pinça. As demais recomendações seguem as mesmas.

WPT: É verdade que não é possível navegar em carrosséis usando leitores de tela?

Odilon: Para que um carrossel funcione em um leitor de telas, ele precisaria ser construído de um jeito diferente do que acontece habitualmente. Então, é verdade que os carrosséis construídos, rapidamente, a partir de plugins e templates prontos não funcionarão bem com leitores de telas. Mas seria possível arrumar soluções acessíveis, sim. 

A questão que talvez assuste os times de desenvolvimento é que, como todo mundo está acostumado a fazer um carrossel rapidamente, o tempo de programação e testes para se criar um carrossel acessível seria maior e isso pode afastar. 

É o mesmo pensamento sobre quem salva textos como imagem. É possível ter layouts bonitos e acessíveis que separam o que é texto do que é imagem? Sim. Mas demanda mais tempo de desenvolvimento.

* Esta reportagem contou com o apoio de Luciana Quintão de Moraes, poeta, graduada em Letras e voluntária do Movimento Web para Todos. 


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