“Não contemplar a acessibilidade é uma falha não só humana, mas comercial”, diz Beto Pereira


Captura de tela da transmissão da live exibe os rostos dos seis convidados, separados em pequenos retângulos dispostos lado a lado. Da esquerda para a direita: Simone Freire, João Bezerra Leite, Henri Fontana, Ronaldo Tenório, Paloma Bueno (intérprete de Libras) e Beto Pereira.
Especialistas participam do primeiro meet up virtual do Movimento Web para Todos. Imagem: Reprodução YouTube Movimento Web para Todos.

Como forma de contribuir para a construção de uma web mais inclusiva para todos, realizamos nosso primeiro meet up virtual  pelo YouTube com o tema: “Por que acessibilidade digital é urgente em tempos de coronavírus?”. Essa foi a primeira de uma série de conversas que vamos promover durante este mês de abril com a presença de diversos especialistas em acessibilidade digital.

Transmitido ao vivo na quinta-feira passada (9/4), o vídeo somou quase 2 mil visualizações, com muita interação entre os participantes, que enviaram dezenas de comentários para os especialistas convidados – João Bezerra Leite, Embaixador do Movimento Web para Todos, que participou como o mediador do bate-papo; Simone Freire, idealizadora do Movimento Web para Todos; Henri Fontana, gerente técnico de Programas no Google EUA; Ronaldo Tenório, CEO da Hand Talk, e Beto Pereira, presidente da Organização Nacional dos Cegos do Brasil (ONCB). 

Durante o bate-papo, Beto Pereira, que é cego, lembrou a oportunidade comercial que muitas empresas estão perdendo, além das razões sociais e humanitárias para colocar a acessibilidade digital em prática. “São essas 45 milhões de pessoas com deficiência que a empresa pode atingir, inclusive familiares e amigos. Esse é um número que deve ser trabalhado e considerado comercialmente. Não estamos falando de sermos bonzinhos, mas de atendermos os anseios de um segmento e de considerar as pessoas. Quero ser uma pessoa ativa na internet. Quero comprar ações, serviços, produtos, quero saber os detalhes deles também. Não contemplar a acessibilidade é uma falha não só humana, mas uma falha comercial. Precisamos fazer essa mudança rápida, mas de forma leve”, comentou. 

As dúvidas dos participantes foram sendo esclarecidas durante o bate-papo com os especialistas. Uma delas refere-se à acessibilidade das redes sociais. Simone Freire,  nossa idealizadora, explicou que sim, as plataformas mais utilizadas hoje já estão acessíveis para pessoas com deficiência. “O que não é acessível é o conteúdo que as pessoas publicam. Tem a questão das hashtags para a descrição de imagens, o YouTube permite inserção de legenda automaticamente, e uma série de recursos estão disponíveis para eliminar barreiras de acesso. O que falta é o conhecimento da sociedade sobre o que precisamos fazer para que o nosso  conteúdo possa chegar às pessoas com e sem deficiência”, explicou. 

Onde encontrar a informação 

Um erro muito comum, segundo Henri Fontana, do Google, é que muitos profissionais e organizações só olham para acessibilidade quando o projeto está quase pronto. “Se você leva a acessibilidade digital desde o começo, o custo é muito menor e o risco de impactar o projeto no final é menor também”, disse. Em relação ao framework e linguagem de software, ele destaca que cabe aos desenvolvedores seguirem as práticas recomendadas do WCAG para tornar esses aplicativos acessíveis.

“E o WCAG é algo para ser seguido?”, perguntou uma participante do chat. “Sem dúvida alguma. Falamos que o WCAG é a bíblia da acessibilidade. Você consegue assegurar que seu conteúdo esteja acessível para todas as pessoas. São inúmeras diretrizes, mas você pode ver as principais que estão no site do Movimento Web para Todos. Usamos também o eMAG, que segue algumas das recomendações do WCAG e traz algumas especificidades da realidade da web brasileira”, acrescentou Simone. 

Para aprender mais sobre acessibilidade, Ronaldo Tenório, da Hand Talk, afirmou que não faltam conteúdos na web para aprender sobre o assunto. “Você pode aprender bastante com os canais do Movimento. Muitas vezes as pessoas acham que precisam ser especialistas para colocar a acessibilidade em prática, mas não é verdade. É importante dar o primeiro passo. Isso vai contaminando positivamente quem está do seu lado. Nos canais da Hand Talk, também compartilhamos muita informação. Conteúdos não faltam na web. Ao dar o primeiro passo, você pode fazer a diferença na vida de alguém”, enfatizou. 

Simone complementou sobre o trabalho do Movimento Web para Todos que, entre diversas ações, tem buscado: compartilhar informações com estudantes (de universidades, cursos técnicos, entre outros), formar profissionais com cursos e disseminar conteúdo gratuito por meio de diversas iniciativas, como os meet ups. “É um universo muito grande para trabalhar. Estamos focados em escolas de marketing digital, porque sabemos que muitos profissionais que estão no mercado acabam se formando nesses locais. Eles precisam ser conscientizados dessa realidade de exclusão digital e da existência da acessibilidade. Infelizmente, muitos não sabem ou não têm noção”, explicou. 

E que tal a disciplina de acessibilidade digital nos cursos técnicos, de graduação e pós-graduação? Beto Pereira destacou esse ponto. “O caminho é atrelar a necessidade pensando na falta de profissionais capacitados e realmente fazer algo no sentido para que cursos técnicos, de graduação e pós-graduação sejam validados para disponibilizar o assunto, fazer com que o estudante possa se debruçar um pouco no tema da pessoa com deficiência, no respeito à diversidade humana. Como lidar com o segmento de forma simpática a esse movimento? O desafio é muito grande, mas está bastante no processo de educar os profissionais”, pontuou. 

De onde vem a mudança 

Henri, que reside há quase oito anos na Califórnia, nos Estados Unidos, destacou a atuação e a conscientização das pessoas e do governo americano em relação à acessibilidade digital. Segundo ele, a maior parte dos sites do governo dos EUA é acessível por conta da lei daquele país. Em 2018, o número de processos  contra sites e plataformas sem acessibilidade triplicou. “Aqui nos EUA é doendo no bolso, e isso, de alguma forma, entra na rotina. Se a motivação inicial foi por meio de prejuízo financeiro, paciência. Com o tempo, as pessoas acabam se conscientizando. Essa é a minha esperança.” 

Ronaldo, da Hand Talk, concorda que a mudança precisa acontecer – seja pelo amor ou pela dor. “Pega muito feio para as empresas não estarem com seus sites e plataformas acessíveis. Uma vez uma empresa me disse: ‘Eu tenho vergonha de não estar com o site acessível’. Eu percebo que é muito mais vantajoso que as organizações se antecipem aos processos e multas. É muito melhor que elas criem ações e usufruam de serem inovadoras ao colocar a acessibilidade em prática para atender melhor o público.”

Próximos passos em tempos de pandemia 

Mas qual é o principal caminho para minimizar a falta de acessibilidade digital? Como resolver esse desafio? Todos os participantes concordaram que é preciso, também, ter muita empatia por esta grande parcela da população.

Para Beto, “é tempo de olhar para o outro e praticar o respeito. E tocarmos a vida frente aos desafios que enfrentamos também nos faz crescer como seres humanos”. Simone concorda e destaca: “Precisamos sair dessa bolha de achar que a deficiência está no outro, que não temos contato com o assunto, que isso é um problema do outro. Não é!” 

Ronaldo mencionou algumas ações que a Hand Talk tem promovido para tornar o conteúdo informativo (principalmente sobre a pandemia do coronavírus) acessível para a comunidade surda. Uma delas é a distribuição gratuita do plugin para tradução de textos em Libras para portais de notícias que estão cobrindo o tema, como também divulgando um vídeo com o avatar Hugo dando dicas de prevenção em Libras para os surdos. “Acredito que vamos sair dessa com muito mais empatia, olhando mais para o lado. As relações humanas estão sendo afetadas e vamos ter esse legado futuro das pessoas se importando mais com as outras. É preciso dar o primeiro passo pela acessibilidade digital.”

Para os profissionais da área, Henri deu uma dica. “Tenham em mente que quando vocês desenvolvem com acessibilidade, você estão melhorando o produto para todos. Quando você trabalha com foco na acessibilidade, desenvolve melhores produtos também para todos. Não tem desculpa. O conhecimento está aí. Precisamos que vocês levem essa mensagem para as empresas, que a gente vira o jogo rapidinho.”

O bate-papo foi mediado pelo embaixador do Movimento Web para Todos, João Bezerra leite, um ativista apaixonado pela causa da acessibilidade digital com experiência de mais de 30 anos no segmento financeiro, e contou com a tradução em Libras, em tempo real, pela parceria da nossa rede, a Paloma Bueno.

Nos links abaixo, você pode assistir todas as lives que fizemos no mês de abril.

– [MEET UP 1] Por que acessibilidade digital é urgente em tempos de coronavírus?
– [MEET UP 2] Por que os varejistas online ignoram as vendas para o consumidor com deficiência?
– [MEET UP 3] Acessibilidade digital: como produzir conteúdo para ampliar a sua audiência?
[MEET UP 4] O que não pode faltar na hora de construir ambientes digitais mais inclusivos?

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